O cérebro humano é mais complexo do que qualquer outra estrutura do universo conhecida. Pesa em média 3kg!! Esta massa esponjosa de gordura e proteína é composta por bilhões de neurónios. Acredita-se que usamos apenas 10% da nossa capacidade cerebral.

Quando uma máquina complexa e finamente calibrada é lesionada, ou não cuidada, pode apresentar mau funcionamento, tal como o cérebro que, se exposto a um ambiente físico-químico corrosivo e/ou com falta de “combustível”, sofre danos e disfunções.

Todo o potencial genético de uma criança, que a leva a desenvolver-se física e mentalmente, pode ser inibido devido a uma deficiência de nutrientes e a um ambiente celular tóxico. Crianças e adolescentes com nutrição desadequada ficam expostos a alterações mentais e de comportamento que, muitas vezes, podem ser corrigidas através de medidas alimentares.

Patologias cerebrais durante o envelhecimento também podem surgir devido a falhas nos mecanismos de proteção contra os agressores, principalmente radicais livres e tóxicos presentes, por deficiências nutricionais, como é o caso da deficiência de antioxidantes e outros nutrientes protetores.

Os danos e disfunções consequentes das agressões ambientais cerebrais podem resultar em atraso no desenvolvimento cógnito-motor, hiperatividade, perda de concentração e/ou memória, dislexia, ansiedade, depressão ou podem transformar-se em patologias neurodegenerativas severas como alguns tipos de demência, doença de Alzheimer, Parkinson, Esclerose Lateral e Amiotrófica, entre outras patologias.

 

O CÉREBRO COMO ESTRUTURA

Como qualquer outro órgão, o cérebro é nutrido por substâncias presentes na alimentação – Vitaminas, Minerais, Aminoácidos Essenciais E Ácidos Gordos Essenciais (em inglês “Essencial fatty acids” – EFAs), incluindo o ómega-3 (um ácido gordo polinsaturado).

O cérebro humano é formado por, aproximadamente, 60% de gordura. Estudos têm mostrado que os ácidos gordos fazem parte do grupo de moléculas que determinam a integridade e funcionalidade do cérebro humano.

Entre os ómega-3 polinsaturados, o ácido alfa linolénico (ALA) é um ácido gordo que possibilitou demonstrar fielmente o efeito do seu consumo alimentar, para a estrutura, a química e a função cerebral. Além do ALA, o ácido docosa-hexaenóico (DHA) é um dos maiores elementos de construção das membranas de fosfolípidos do cérebro e absolutamente necessário para a função neuronal.

Foi demonstrado que a diferenciação e funcionalidade das culturas de células cerebrais requeria não apenas ALA, mas também cadeias longas de ómega 3 DHA e de ómega 6. A deficiência destas cadeias apresenta alterações no desenvolvimento do cérebro, perturbações na composição das membranas celulares, de neurónios, de oligodendrócitos e de astrócitos, assim como alterações na mielina, nas terminações nervosas e nas mitocôndrias das células. É de notar que os astrócitos são as células em formato de estrela mais abundantes do sistema nervoso central e são as que possuem maiores dimensões; compõem as conhecidas substâncias cinzenta e branca.

As alterações induzem modificações físico-químicas nas membranas e resultam em perturbações neurossensoriais  e comportamentais.

O ómega 3 alimentar está envolvido na prevenção de vários aspetos das patologias isquémicas cardiovasculares (incluindo a níveis da vascularização cerebral), e na prevenção de algumas patologias neuropsiquiátricas, particularmente a depressão, mas também a demência, como a doença de Alzheimer e demência vascular.

A falta destas gorduras pode impedir a renovação das membranas e consequentemente acelerar o envelhecimento cerebral.

Quando se fala em ómegas 3, peixe é a das primeiras coisas que nos vêm à mente. Por exemplo o salmão, truta e sardinhas são realmente grandes fontes de ácidos gordos ómega 3.

Mas também as sementes de chia, de linhaça e as nozes contêm ALA, e além disso são ricas em fibra e em alguns aminoácidos.

Alguns tipos de algas são importantes fontes de ómegas 3, com aporte de DHA e ácido eicosapentaenóico (EPA), estes encontram-se disponíveis principalmente na suplementação.

Os EFAs são requeridos para a manutenção da saúde neural ótima, no entanto não são sintetizados pelo corpo e devem ser obtidos através de fontes alimentares.

Muitos estudos observacionais relacionaram os hábitos alimentares, que incluem mais ou menos ácidos gordos, com a performance cerebral e algumas patologias.

Estudos indicam que mulheres cujo aporte de ómegas 3 foi reduzido durante a gravidez apresentam um risco elevado de depressão pós-parto. Estas gorduras essenciais são distribuídas para o desenvolvimento do feto e se o consumo alimentar da mãe for reduzido, poderá ficar com escassez do ómega 3 para a sua função neurobiológica. Este défice leva a alterações associadas a depressão, incluindo a uma redução do fator neurotrófico no hipocampo e aumento das respostas a stresse provenientes do eixo hipotalâmico-hipófise-adrenal.

O desenvolvimento do cérebro fica completo perto dos 5-6 anos de idade. Os EFAs, particularmente o ómega 3, são essenciais para o desenvolvimento do cérebro durante o período fetal e pós-natal. O ácido decosa-hexaenóico (DHA) é necessário para a maturação funcional ótima da retina e do córtex visual, tendo sido demonstrada uma maior acuidade visual e desenvolvimento mental aquando de um consumo de DHA extra.

Além do importante papel na construção da estrutura cerebral, os EFAs, como mensageiros, estão envolvidos na síntese e funcionamento de neurotransmissores cerebrais, e nas moléculas do sistema imunitário. As membranas neuronais contêm reservatórios de fosfolípidos, um tipo de ácidos gordos, para a síntese específica de lípidos mensageiros que atuam na estimulação neuronal ou na resposta à lesão.

São, também, necessários micronutrientes para fornecer combustível útil a nível químico cerebral, principalmente para a formação de neurotransmissores. Os neurotransmissores são produzidos por células nervosas a nível cerebral e a nível enteral, enviando sinais de informação a outras células, estimulam a continuidade de um impulso ou podem efetuar uma reação num órgão ou músculo alvo. Alguns neurotransmissores também são hormonas, como: a serotonina, a oxitocina, a dopamina, o cortisol, entre outros.

Eis alguns micronutrientes e a sua ação como combustível funcional do cérebro:

  1. Para produzir energia, o tecido nervoso usa glicose (açúcar) que necessita da presença de vitamina B1, esta vitamina modula a performance cognitiva, especialmente com a idade avançada.
  2. As Vitaminas B6 e B12 atuam beneficamente no tratamento dos sintomas da depressão pré-menstrual e estão diretamente envolvidas na síntese de vários neurotransmissores.
  3. A vitamina B12 atrasa sinais de demência (e anormalidades sanguíneas). A suplementação com cobalamina (vit. B12) melhora as funções cerebrais e cognitivas em idosos; frequentemente mostra efeitos benéficos em funções relacionadas com o lobo frontal, assim como na área da linguagem afetada por desordens cognitivas.
  4. Depois das terminações nervosas das glândulas adrenais, as terminações nervosas do cérebro são as que contêm maiores concentrações de vitamina C do corpo humano.
  5. A vitamina D é de interesse na prevenção de vários processos neurodegenerativos ou patologias neuro-imunes.
  6. Entre vários componentes da vitamina E (tocoferóis e tocotrienóis), apenas o alfa-tocoferol é ativamente absorvido pelo cérebro. Este antioxidante está envolvido diretamente na proteção de membranas nervosas.
  7. O Ferro é necessário para assegurar a oxigenação, para produzir energia no parênquima cerebral e para a síntese de neurotransmissores e de mielina. Têm-se encontrado deficiência de Ferro em crianças com distúrbio de défice de atenção/hiperatividade e uma relação entre as concentrações de Ferro na artéria umbilical e o desenvolvimento do feto e o QI das crianças.
  8. O Zinco participa, entre outros oligoelementos, na perceção do paladar e as memórias gustativas.
  9. O desequilíbrio no metabolismo homeostático do Cobre (devido a défice alimentar) pode estar associado a doença de Alzheimer.
  10. O Iodo promove a produção de hormonas tiroideias, assegurando o metabolismo energético necessário às células cerebrais; a falta significativa de iodo durante a gravidez induz a severas disfunções cerebrais, nomeadamente a um processo de cretinismo (uma perturbação grave que resulta em atraso no desenvolvimento físico e mental).
  11. Envolvidos em vários mecanismos, o Manganês, Cobre e Zinco participam em mecanismos enzimáticos que protegem o cérebro contra radicais livres e outros tóxicos.

 

ALIMENTOS ANTIOXIDANTES PARA PROTEGER O TECIDO CEREBRAL

Para proteger dos elementos corrosivos a que o cérebro fica exposto, o consumo de alimentos ricos em antioxidantes mostra-se primordial.

Os frutos vermelhos, nomeadamente mirtilos, arandos, framboesas, amoras, romãs, contêm um aporte grande de antocianinas, um grupo de elementos anti-inflamatórios e antioxidantes. Estes lutam contra o stress oxidativo, inflamação que promovem as patologias neurodegenerativas. Estudos revelam que o consumo frequente se traduz no aumento de memória e concentração.

A Curcumina, o ingrediente ativo do açafrão, consegue atravessar a barreira hematoencefálica e consegue diretamente beneficiar as células cerebrais. Mais uma vez, o efeito antioxidante e anti-inflamatório tem sido relacionado a benefícios quanto à memória, redução de episódios depressivos e ajuda ao aumento do fator neurotrófico-cerebral (um tipo de hormona que ajuda o crescimento cerebral).

Os brócolos também estão numa família poderosa de vegetais: as crucíferas. Ricas em antioxidantes e vitamina K, entre outros. A vitamina K, é lipossolúvel e essencial à formação dos fosfolípidos, é um tipo de gordura densamente compactada nas células cerebrais. Vários estudos realizados em idosos têm mostrado que o aumento de vitamina K melhora a memória.

Para a concentração e memória o cérebro usa níveis elevados de vitaminas B6, B12, folatos e colina. Através destes nutrientes o cérebro consegue produzir acetilcolina, um neurotransmissor essencial à energia cognitiva. Encontramos colina em alimentos como: os ovos, a levedura de cerveja, o fígado de galinha, a vitela, a mostarda, entre outros.

Alguns componentes como a L-teanina, e outros aminoácidos que atravessam a barreira cerebral aumentam significativamente a atividade do neurotransmissor Ácido gama-aminobutírico (GABA), importante inibidor do sistema nervoso, que regula a ansiedade e ajuda a relaxar. A L-teanina também aumenta a frequência de ondas-alfa no cérebro que ajudam a diminuir os sintomas de cansaço. Estes elementos estão presentes no chá verde.

 

ALIMENTOS PARA MELHORAR O HUMOR E BEM-ESTAR

Hábitos alimentares pobres em gordura parecem ter efeitos significativos no humor e no controlo de estados depressivos, no entanto, mais elementos estão envolvidos no temperamento e humor.

A composição de proteínas alimentares – os aminoácidos (a.a.) – contribui muito para a função cerebral. Nomeadamente, o aminoácido triptofano que atua como precursor de um neurotransmissor chamado serotonina que, por sua vez, desempenha um papel no processo digestivo, no sono e principalmente no estado de prazer e animo.

O cérebro consome cerca de 50% dos hidratos carbono para a obtenção de energia cognitiva, percebeu-se então, que através do consumo de alimentos com reduzido índice glicémico, que asseguram níveis baixos de insulina, mantêm-se valores equilibrados de glicose no sangue que irriga o cérebro e assim melhora-se a qualidade e a duração do desempenho intelectual. Por exemplo uma conjugação de Hidratos de carbono complexos (tais como aveia/quinoa), amêndoas, ½ banana e 1 quadrado de chocolate com 80% cacau são uma conjugação útil para fornecimento energético e efeito modulador do stress e bem-estar.

 

ALIMENTOS A EVITAR

O consumo frequente de açúcares (refrigerantes, guloseimas, bolos, etc.) e por consequência a resistência insulínica e diabetes tipo 2, tem sido relacionado com a presença de doenças neurodegenerativas tais como a patologia de Alzheimer. Esta patologia já foi até co-denominada “diabetes tipo 3”.

Além do açúcar na sua forma mais comum, inclusive os adoçantes naturais (como frutose/ xaropes de milho), e artificiais (como o aspartame) têm sido identificados como potenciadores de risco a hiperatividade cerebral, disfunção cognitiva, falta de memória e demência. O aspartame é composto por fenilalanina, metanol e ácido aspártico; a fenilalanina consegue atravessar a barreira hematoencefálica e interrompe a produção de neurotransmissores. Além disso, aumenta a vulnerabilidade do cérebro ao stress oxidativo que corrói o tecido cerebral.

Alimentos que contêm elevados níveis de gorduras Trans e saturadas são fatores que alimentam inflamação generalizada orgânica, incluindo no cérebro, transtornando a estrutura lipídica sã e protetora. A avaliação do gene ApoE tem sido vantajosa para identificar uma maior ou menor necessidade de consumo alimentar no que toca ao consumo lipídico visando a modulação das gorduras cerebrais e prevenindo patologias.

O hábito de beber 1-2 copos de vinho mais do que 3-4x/semana, ou outra bebida alcoólica mais forte, traduz-se num consumo crónico. Esta cronicidade reduz a longo prazo o volume cerebral, provoca alterações metabólicas da formação de neurotransmissores, principalmente os que atuam na área da comunicação. A constante necessidade de desintoxicação hepática do álcool, e os outros tóxicos a que estamos expostos, provoca frequentemente um défice de vitamina B1, que no cérebro pode conduzir a desordens encefalopáticas (como a encefalopatia de Wernicke).

De facto, o peixe possui proteína de grande qualidade e contem muitos nutrientes importantes, como o ómega 3, vitamina B12, zinco, ferro e magnésio. Daí que o seu consumo é recomendado e deve ser frequente (em detrimento da carne).

Mantem-se, no entanto, a necessidade de valorizar a qualidade do mesmo ou a sua fonte, principalmente devido ao seu teor de metais pesados. Peixes predadores de vida longa são particularmente suscetíveis à acumulação de mercúrio e podem transportar quantidades acima de 1 milhão de vezes mais do que a concentração da água circundante. Após o consumo destes peixes, este metal pesado distribui-se pelo corpo e concentra-se no cérebro, fígado e rins. Em mulheres grávidas também se concentra na placenta e no feto. Os efeitos da toxicidade pelo mercúrio incluem rutura de vias nervosas, alteração de neurotransmissores e estimulação de neurotoxinas, o resultado envolve dano cerebral.

Para o caminho da prevenção e aumento de qualidade de vida precisamos de manter o foco na nossa estrutura física e química, motora e intelectual. Se por um lado, podemos estar isentos de responsabilidade, pela incapacidade de gestão a algumas exposições diárias, muita responsabilidade também nos é colocada pelas nossas escolhas alimentares e de estilo de vida. Citando o Prof. Dr. Gabriel Carvalho, ‘a cada garfada definimos o nosso destino’.

 

Sabia que uma avaliação da sua epigenética pode ser útil para prevenir patologias crónicas?

 

Nutrição Funcional e Nutrigenómica

Fontes:

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